Nosso país vive uma onda de repressão dirigida a organizações e políticos de esquerda em geral, movimentos sociais, universidades, escolas e artistas.
Esse movimento tomou diversas formas nos últimos meses: a proibição da realização de atividades e exposições artísticas; conduções coercitivas aplicadas de maneira abusiva (violando a já pouco democrática Constituição atual); demissão de professores; a prisão de dirigentes do MST e do MTST; etc.
Nas universidades, isso tomou forma na proibição de grupos de estudo que tinham como temática o marxismo (como ocorreu na UFMG); a proibição de “atos a favor ou contra o Impeachment”, visando impedir a manifestação da comunidade universitária contra a derrubada do governo anterior pelo atual ilegítimo (ocorrida em Goiás visando a reitoria da UFG, mas que foi usada em âmbito nacional, como na realização de atos em órgãos públicos no Amazonas); e, mais recentemente, pela condução coercitiva a reitores da UFSC e da UFMG.
No caso da UFSC, o Ministério Público, não satisfeito com a condução coercitiva abusiva, ainda prendeu e fez passar por revista íntima o reitor (só solto por decisão de outro órgão jurídico), além de o destituir de seu cargo e o impedir de entrar na universidade, o que acabou por resultar em seu suicídio.
Para quem viveu, ou conhece minimamente a história da Ditadura e como se deu a repressão nas universidades na época, salta aos olhos algumas semelhanças. O nome da operação realizada na UFMG, “Esperança Equilibrista”, é uma provocação aberta, dirigida a associar as denúncias à ditadura à corrupção, como fazem os grupos de extrema-direita desde que vários presos políticos receberam justas indenizações (seu alvo, como se sabe, foi o “Memorial da Anistia Política do Brasil”). No caso da UFSC, embora não tão explícita, a associação com a ditadura é ainda mais grave; como chamou a atenção Roberto Romano, em seu artigo “Suicídio do reitor ou da universidade livre?”[1], que
O primeiro traço a chamar nossa memória encontra-se em algo que desagrega toda sociedade, em especial a reunida nos campi. Trata-se da abjeta delação que volta a ser empregada como instrumento repressivo por agentes do Estado, em setores midiáticos e na própria universidade. No caso em pauta, o estopim da crise reside numa delação contra o reitor. O dirigente foi preso e submetido ao escárnio público sem os mínimos requisitos de justiça, como o direito de ser ouvido antes de encarcerado. Os repressores e seus aliados da imprensa não se preocuparam um só instante com a sua honra e a dignidade do cargo por ele ocupado. Ele foi exposto à execração popular sem nenhuma prudência. Em país onde ocorrem a cada instante casos como o da Escola Base, os linchamentos reiteram a barbárie. Todos os pesquisadores e docentes que pensam e agem com prudência, recordam os procedimentos impostos à academia após o golpe de 1964. As cassações de funcionários, lentes, estudantes, anunciaram a posterior tortura, morte e aniquilação dos direitos. Delatores surgiram como cogumelos nas escolas de ensino superior, com os dedos em riste contra adversários ideológicos ou concorrentes bem-sucedidos aos cargos, pesquisadores com maior notoriedade junto aos poderes públicos, à comunidade universitária mundial, ao público. O Livro Negro da USP traz relatos nauseantes de prática acusatória e anônima, na qual as baixezas emulavam a covardia. Quem foi delatado perdia tudo e foi tangido rumo às prisões ou exílio. O indigitado, não raro, era posto na “cadeira do dragão” e outros tormentos, após seguir o caminho de orgãos como o DOPS em veículos oficiais, cedidos por dirigentes universitários ao aparato policial.
Ele relata também que, convidado a falar na Comissão Especial da Câmara que analisava o projeto de lei sobre as “Dez Medidas Contra a Corrupção”, criticou o uso dos delatores pagos e a “sugestão” de armar processos a partir de provas ilícitas, mas elaboradas “de boa fé” (conferir o site oficial da Câmara dos Deputados: “Especialistas apontam falhas em medidas de combate à corrupção sugeridas pelo MP”, 22/08/2016).
Além do mais, em 21/11/2017, o diretor da unidade de São Cristóvão do Colégio Pedro II recebeu voz de prisão em flagrante por falso testemunho. O Diretor se retratou e em seguida foi liberado. Vale ressaltar que quando há retratação em crime de falso testemunho é extinta a punibilidade. É o que se chama de “arrependimento eficaz” em Direito Penal. Do que se conclui que, aí também, a prisão em flagrante desqualificou a imagem do gestor.
A ofensiva contra as universidades e aos Institutos Federais são uma dimensão do ataque às liberdades democráticas que restam e da tentativa de erigir o MP e o Poder Judiciário como poderes totalitários no país. A violação das universidades, a coerção e prisão injustificada de dirigentes e professores é inaceitável. Estas ações, por outro lado, se inserem na tentativa de descredenciar e desmoralizar as universidades brasileiras e os Institutos Federais no momento em que o Banco Mundial exige sua privatização.
O ANDES-SN deve tomar posição incondicional contra este estado de coisas!
TR: O 37º CONGRESSO DO ANDES se posiciona:
- Contra as ações de violação das universidades, dos Institutos Federais e defesa de sua autonomia;
- Contra a criminalização de seus dirigentes, conduções coercitivas e prisões injustificadas;
- Em solidariedade às instituições violadas, como a UFMG e a UFSC, e aos professores atingidos.
- Favorável à proposta da ANPED e outros setores de criação de uma lei contra o abuso de autoridade;
- Pela realização de uma campanha de denúncia ampla das arbitrariedades.
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Tese apresentada ao tema II – Políticas Sociais e Plano Geral de Lutas
Assinam:
DIRETORIA DA ADUFERPE, BETH LIMA (CONSELHEIRA DA ADUSP), DAVI ROMÃO (PRESIDENTE DA APUR), DOMINGOS SÁVIO GARCIA (PRESIDENTE DA ADUNEMAT), EVERALDO ANDRADE (CONSELHO DE REPRESENTANTES ADUSP), FERNANDO CUNHA (DIRETOR DA ADUFPB), FLÁVIO FURTADO DE FARIAS (REPRESENTANTE REGIONAL DA ADUFPI/PARNAÍBA), JEAN-PIERRE CHAUVIN (CONSELHO DE REPRESENTANTES ADUSP), JULIO CÉSAR COSTA CAMPOS (DIRETOR DA ASPUV- UFV), JURANDIR GONÇALVES LIMA (PRESIDENTE DA ADUFPI), LISLEANDRA MACHADO (CONSELHO DE REPRESENTANTES DA APES), LUCIENE NEVES (DIRETORA DA ADUNEMAT), LUIZ DO NASCIMENTO CARVALHO (PRESIDENTE DA ADCAC), MAIRTON CELESTINO DA SILVA (DIRETOR DA ADUFPI), MARIA CARANEZ CARLOTTO (PRESIDENTE DA ADUFABC), MARIA DE LURDES ROCHA LIMA NUNES (DIRETORA DA ADUFPI), SILVINA CARRIZO (CONSELHO DE REPRESENTANTES DA APES).
[1] Publicado originalmente no Jornal da Unicamp, https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/roberto-romano/suicidio-do-reitor-ou-da-universidade-livre no dia 4 de outubro de 2017.
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