O governo Bolsonaro redobrou os ataques às Universidades e aos serviços públicos do país. Se implementadas suas medidas, o estado brasileiro será resumido a uma máquina de arrecadação de impostos a servir apenas ao pagamento de juros aos banqueiros e aos rentistas, esmagando como nunca os gastos sociais.
O “NOVO” FUTURE-SE
O MEC apresentou uma nova versão do Future-se. Decidiu reescreve-lo, fingindo contornar sua evidente inconstitucionalidade, após ver o projeto original ser amplamente rejeitado na comunidade acadêmica nacional e na imprensa. A nova versão altera palavras, mas mantém o conteúdo da original.
VEJAMOS SEUS PONTOS CENTRAIS:
1. Ela introduz um “contrato de desempenho” ao qual as Universidades terão de firmar se quiserem ter “benefícios especiais” que viriam de um “Fundo Soberano do Conhecimento”.
2. Tal “Fundo”, destinado ao “empreendedorismo, inovação e internacionalização”, deve usar verbas do FINEP, CNPq e do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) – que deixarão de existir. Ele seria negociado na Bolsa de Valores, regido por suas normas, e liberaria recursos apenas à inovação (que tenha utilidade empresarial, por suposto) em detrimento da pesquisa básica, da teórica ou mesmo das aplicadas não diretamente do interesse empresarial como as voltadas às questões nacionais, culturais ou sociais.
3. O novo Future-se segue liquidando com o poder decisório dos órgãos colegiados, transferindo a gestão para entidades privadas externas – ferindo o princípio constitucional da autonomia e democracia universitárias. Mas agora, a gestão ficaria com fundações de amparo, ao invés de OSs ou startups, como proposto no texto original. Isso é trocar seis por meia dúzia.
4. Enquanto corta verbas às Universidades, o MEC quer força-las a aderir ao “contrato” e, assim, faze-las submeter-se a normas externas de desempenho que imporiam maior ou menor redução dos salários dos docentes e TAEs. Com isso, o projeto segue inconstitucional por atropelar a autonomia universitária. O novo Future-se tampouco assegura o uso autônomo das receitas próprias – que só poderiam ser aplicados com o cumprimento das metas.
E tais metas, no novo texto, são ainda mais restritivas, seguindo sua lógica “empresarial inovacionista”. O MEC cria a ilusão de que empresas privadas estariam ávidas por investir os tubos. Isso é falso e nunca ocorreu. Ainda mais num Brasil em rápida desindustrialização, controlado por multinacionais e pelo financismo. Ademais, universidade de qualidade – em qualquer lugar do mundo, e ainda mais no Brasil – só pode existir se for financiada essencialmente por verbas públicas. Verbas privadas, quando existem, são apenas complementares (e devem respeitar a autonomia).
PACOTAÇO GUEDES ATACA DOCENTES E SERVIÇOS
Já o chamado “Plano Brasil Mais” está subdividido em três PECs: o “pacto federativo”, o “emergencial”, e o “dos fundos públicos”. O mote de suas medidas – “desvincular, desobrigar, desindexar” – parte de três pressupostos mentirosos repetidos à exaustão pelo governo – com apoio da mídia e do mercado financeiro:
Primeiro, alegam de que o déficit público seria causado por um suposto crescimento do gasto social. Falso. O déficit cresceu (2014-19) devido à queda na arrecadação – decorrente da recessão causada em boa medida pelo próprio ciclo vicioso do ajuste fiscal. Não houve elevação de gastos, muito menos os sociais. Houve sim a manutenção do expressivo montante de gastos com juros da dívida pública.
Segundo, alegam que haveria um “engessamento da constituição”. Mas a obrigatoriedade dos chamados “gastos vinculados”, os mínimos de gastos com Saúde e Educação e de fundos como o FUNDEB (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica), e a indexação de benefícios (aposentadorias e pensões), são fundamentais para preservar, independente de governos, políticas públicas mínimas ao desenvolvimento do país e ao bem estar da população.
Por fim, pressupõem que o estado deve ser mínimo apenas ao povo; mas máximo para os banqueiros e parasitas. O grosso das medidas é feito para elevar o pagamento de juros às custas do esmagamento dos gastos sociais. Os verdadeiros marajás (a alta cúpula militar, do Judiciário, da diplomacia e do Congresso) não serão atingidos.
ATAQUE À PESQUISA, A CARREIRA E AOS SALÁRIOS
As PECs visam aprofundar a EC95 de Temer – que congelou por 20 anos as verbas de Saúde e Educação – punindo servidores e gastos sociais. Assim, caso despesas correntes (salários, benefícios de aposentadoria, contas de luz e vários outros custeios) superem a arrecadação, disparam-se gatilhos bianuais levando o governo a:
1. Vetar promoções de funcionários públicos;
2. Impedir reajustes salariais, criação de cargos, reestruturação de carreira, concursos, e verbas indenizatórias;
3. Reduzir a jornada e o salário em até 25%. No caso dos docentes (dado o tipo de trabalho que exercemos) a redução de fato será apenas nos salários.
4. Ademais, seriam eliminados a maioria dos (218) Fundos Públicos, alguns dos quais essenciais para o desenvolvimento do país e, particularmente, da pesquisa acadêmica, científica e cultural, como por exemplo o FNDCT. O dinheiro de tais fundos (no mínimo R$ 220 bi) será todo destinado ao pagamento da dívida pública.
5. Por fim, uma série de outras maldades sociais – como a proibição de aumento do salário mínimo, esmagamento dos gastos mínimos de estados e municípios em Saúde e Educação etc. – serão também atingidas.
TIRA DOS POBRES E DÁ AOS BANQUEIROS
Além de forçar os servidores públicos que não são marajás (60% recebem menos de R$ 4 mil) e o povo que mais necessita dos serviços sociais a pagarem o pato, o pacotaço faz uma distribuição de renda a lá Robin Hood às avessas – tudo para satisfazer o mercado financeiro. Ademais, impede instrumentos fiscais de recuperação econômica: nas recessões, quando o emprego, a renda e arrecadação caem, o setor público terá de reduzir ainda mais gastos, o que alimentará ainda mais a espiral depressiva.
ORGANIZAR A LUTA UNITÁRIA
Em Assembleia Geral da Adunifesp (06/11), docentes de vários campi discutiram e decidiram iniciar a luta coletiva contra tais medidas, em defesa de nossa carreira e da Universidade em unidade com a população que mais carece dos serviços públicos. Chamamos os colegas docentes a debaterem em reuniões nos campi para construirmos um movimento para barrar esse crime pretendido pelo governo Bolsonaro.
PROF. DR. ALBERTO HANDFAS, DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA EPPEN/UNIFESP, SECRETÁRIO-GERAL DA ADUNIFESP
14/11/2019